Quando o boi da Estrela Azul entra no Hospital Oncológico Infantil, a alegria celebra junto
Cortejo leva cultura popular e promove inclusão para crianças e adolescentes em tratamento contra o câncer

A manhã deste sexta-feira (23) não foi comum no Hospital Oncológico Infantil Octávio Lobo (Hoiol). Nos corredores do hospital, o som contagiante dos tambores, maracás, reco-recos, trompetes anunciavam as toadas de boi. Fitinhas coloridas balançavam no ar, e sorrisos surgiam por trás das máscaras e dos lençóis. Era o Arraial do Pavulagem chegando com seu batalhão da Estrela Azul, em uma onda de cultura popular, alegria e responsabilidade social na abertura da quadra junina da instituição de saúde.
Para os cerca de 80 pacientes que presenciaram a ação, entre crianças internadas e estudantes da Classe Hospitalar, mais que um espetáculo folclórico, o cortejo proporcionou um reencontro com a alegria. A cada passo do boi, a cada batida da percussão, desenhava-se um momento de leveza em meio à rotina de exames, medicamentos e isolamento social. “É como se a gente esquecesse por um instante que está num hospital”, disse Nilson Marques, de 19 anos, que faz tratamento contra linfoma e cursa o 1º e 2º na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA). “A gente sorri, canta, se diverte. Isso faz muito bem para a cabeça e para o coração.”

A ação não é nova. Desde 2015, o coletivo Arraial do Pavulagem leva o cortejo ao hospital como parte do calendário junino da instituição. A parceria, que já se tornou tradição, representa mais do que um momento festivo. É parte de um projeto sério de humanização do ambiente hospitalar, articulado por profissionais de saúde, educadores e voluntários que entendem que cuidar também é emocionar.
Para Natacha Cardoso, coordenadora de Humanização do Hoiol, levar a cultura popular para dentro da unidade hospitalar tem um impacto além do entretenimento, também favorece o contexto educacional da Classe Hospitalar, onde a proposta é integrar saberes por meio da interdisciplinaridade. “Trazemos a cultura amazônica para dentro da sala de aula, e os alunos aprendem brincando. É um jeito lúdico e afetivo de aproximar conhecimento e identidade. Já para os pacientes internados e colaboradores, a presença do boi da Estrela Azul representa um respiro de bem-estar e alegria; o colorido das fitas, a música e o movimento contagiam todos à volta.”
Segundo ela, alguns não podem sair do leito, mas aguardam ansiosos pelo momento. “Percebemos as crianças sentadinhas na porta do quarto, esperando o boi passar, claro que a segurança dos pacientes é sempre prioridade. Antes de qualquer ação com voluntários externos, a equipe de humanização se articula com a enfermagem para garantir que tudo ocorra com o máximo de cuidado. Por isso, meia hora antes da atividade, já sabíamos quais andares poderiam receber o batalhão. Assim, conseguimos levar a festa com segurança, promovendo um momento único de interação, sorrisos e leveza para todos que vivem a rotina hospitalar”, enfatizou.

“Muitos dos nossos alunos vêm do interior e não têm contato com toda essa diversidade cultural. O Arraial traz para dentro do hospital um pedaço da nossa identidade. Eles aprendem, se reconhecem e se sentem parte de algo maior”, disse o professor Marcos Moraes, titular de Matemática da Classe Hospitalar Prof. Roberto França, que é resultado de um convênio de cooperação técnica com a Secretaria de Estado de Educação (Seduc). E por intermédio do Programa de Atendimento Educacional Hospitalar e Domiciliar (AEHD), vinculado à Coordenadoria de Educação Especial (Coees), da Seduc, são garantidas ações inclusivas que respeitam o direito de todos à educação, à cultura e ao encantamento pelo saber.
Aprender com o corpo e com a alma - No embalo do boi, da quadrilha e do carimbó, as crianças também aprendem. A cultura popular, inserida de forma interdisciplinar nas atividades da Classe Hospitalar, desenvolve autonomia, autoestima e identidade. O jovem Nilson resume o que é viver a cultura em um ambiente de tratamento oncológico. “A gente passa muito tempo aqui. Se não fosse por essas atividades, a vida ia ficaria só cinza. Mas com o Arraial, tudo vira cor, som e esperança”, afirmou.

Silvana Pimentel, coordenadora do Arraial do Pavulagem, falou com emoção sobre a participação do coletivo no hospital. “Hoje viemos com cerca de 24 brincantes, mas nosso batalhão é formado por mais de 1.200 pessoas. Todos gostariam de estar aqui, mas por questões de segurança e espaço, precisamos trazer apenas uma parte. Ainda assim, cada um que vem sabe da importância desse momento. É uma alegria imensa para o Arraial poder levar um pouco da nossa cultura popular, com toadas de boi, carimbó e quadrilha para dentro do hospital. A gente vem com o coração aberto, porque sabe que aqui a arte também é cuidado.”
“O cortejo Arraial do Pavulagem pode durar apenas algumas horas, mas o que ele deixa dentro das crianças e adolescentes, e dentro de quem assiste, é emocionante. O riso de quem está em tratamento, o passo tímido de quem levanta da cama para ver o boi, a interação dos pais com as crianças. Tudo isso é parte de algo muito maior, porque a vida continua apesar do adoecimento”, ressaltou Sara Castro, diretora-geral do Hospital.

Serviço - Credenciado como Unidade de Alta Complexidade em Oncologia, o Hospital Oncológico Infantil Octávio Lobo é referência na região Norte no diagnóstico e tratamento especializado do câncer infantojuvenil, na faixa etária entre 0 a 19 anos. A unidade é gerenciada pelo Instituto Diretrizes, sob o contrato de gestão com a Secretaria de Estado de Saúde Pública, e atende pacientes oriundos dos 144 municípios paraenses e estados vizinhos.
Texto: Leila Cruz- Ascom Hoiol